Crianças no Antigo Egito (2)
A infância, tal como entendemos entre nós, se teve algum paralelo no Antigo Egito, durava muito pouco na prática. Dos bebês usualmente era esperado que morressem. Passar dos 5 anos de idade era muito raro e, portanto, a mortandade infantil era encarada com alguma naturalidade, ainda que se fizessem várias coisas para que o bebê sobrevivesse às várias provações de que se via cercado. As mães e cuidadoras os levavam em tipóias presas ao pescoço para onde quer que fossem trabalhar, e dada a sua precariedade existencial, não lhes era dado nada de seu a não ser, quando muito, colares e umbigueiras com amuletos, muitas vezes incluindo o Olho de Hórus, pois não devia estar excluído o olho-grande dentre as causas dos males que afligiam as criancinhas.
Quando começavam a andar e a falar eles começavam a ser socializados sobretudo pelas crianças mais velhas, participando de jogos e brincadeiras, e eram deixados já um tanto quanto soltos para nossos padrões, já que usualmente tinham que dar lugar a mais um recém-chegado. Os egípcios chamavam esta fase da vida de “extrema juventude”, que durava até os 5 ou 6 anos de idade que, na iconografia, era representada pelo dedo na boca e cabelos desarranjados em cachos aparecendo aqui e ali sobe a cabeça raspada, e inteiramente nus, com exceção dos mencionados amuletos. As crianças com algum recurso tinham brinquedos não muito diferentes dos de crianças da era pré-videogame, como bonecas, soldadinhos de madeira, armas de mentirinha, varas, cordas, bolas, etc., mas só as muito abastadas tinham brinquedos individuais, algumas vezes feitos de materiais preciosos, como ébano, marfim e até metais e pedras preciosas. Brincavam também com animais como aves, gatos e cães.
Quando mais crescidinhos se dedicavam a jogos mais “extremos”, como lutas, competições atléticas, danças, e guerras simuladas. Mas depois dos seis anos havia cada vez menos tempo para essas coisas. A maioria seguia a profissão de seus pais, os acompanhavam no trabalho ao campo, as meninas apendiam a cozinhar, tecer e a cuidar das crianças menores. Ao mesmo tempo todos estavam autorizados a usar pelo menos uma tanga ou cinturão e um colar mais elaborado. Mas também, sendo considerados “jovens”, já podiam ser recrutados para trabalhar em construções, carregando talatats que podiam pesar até 5 kg, que ficou marcado no tortuoso desenvolvimento ósseo de crianças das classes trabalhadoras.
Nas elites esta era a fase em que os meninos entravam na Casa da Vida, o centro em que eles aprendiam as artes administrativas, centralizadas no domínio da escrita, recebendo do Estado o seu primeiro benefício na forma de cem arouras (~2,74 hectares) de terra em algum domínio cultivável (com trabalhadores incluídos) que passa a ser sua primeira forma de sustento, a ser aumentado conforme seu progresso na carreira. As meninas entravam no Kheneret, que era uma espécie de pensionato feminino, onde aprendiam a dançar, cantar, maquiagem, higiene, princípios morais e religiosos, mas também administração e, em alguns casos, podiam ser alfabetizadas. As “classes avançadas” do Kheneret podia ser itinerantes, como uma companhia de entretenimento para saudar festivais religiosos, inaugurações, jubileus faraônicos e até mesmo expedições guerreiras. Durante todo o período na Casa da Vida e no Kheneret, os jovenzinhos já trabalhavam em funções de “aprendizes”, os meninos usualmente como secretários, “sacristões” e amanuenses, e as meninas em coros e “corpos de baile” nos festivais e celebrações. Por volta dos 12 ou 13 anos as meninas deixavam o Kheneret usualmente para casar, e as mais talentosas podiam continuar como instrutoras e solistas, mas dificilmente alcançavam cargos de chefia, reservados às moças da aristocracia, que tinham educação ainda mais esmerada. Os rapazinhos podiam ocupar cargos auxiliares aos 12 anos, e cargos oficiais aos 16, momento este em que usualmente deixavam de frequentar a Casa da Vida, e podiam ser nomeados para funções oficiais, como o de purificador (no sacerdócio) ou escriba real (na burocracia). Era quando também muitos se casavam. Elas e eles então se tornam oficialmente adultos, podendo usar o robe senhorial e perucas elaboradas, enquanto que o guarda-roupa dos populares limitava-se praticamente a uma tanga para os homens e um pano enrolado sobre o corpo para as mulheres por toda a vida.
Entre a aristocracia a fase adulta podia vir mais cedo ainda, com casamentos costumeiramente arranjados, e ocupação de cargos elevados frequentemente honoríficos, que membros da camada inferior da elite dificilmente exerciam. Os filhos e filhas do faraó passavam o resto da vida, enquanto vivesse seu divino pai, usando o “cacho da juventude”, como eterna “criança do rei”, ainda que podiam se livrar do ridículo (como o de alguns filhos de Ramsés II, que ainda eram “crianças reais” quando já beiravam os 70 anos) usando simplesmente um aplique que simbolizava aquela posição.
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Na imagem, uma criança da aristocracia, crianças da base da elite e crianças do povo, estas representadas como pequenos adultos, ainda pudessem talvez não ter mais que 6 anos de idade.
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